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27 de mai. de 2011

Agenda Cultural: "Raça Humana"

“Raça Humana” é um disco de 1984 de Gilberto Gil e um dos meus favoritos. Curiosamente, os anos 80 são considerados uma década pobre para a música e, de fato, a maioria dos artistas que haviam se estabelecido nas décadas de 60 e 70 estavam em baixa. Gilberto Gil, no entanto, ainda estava produzindo obras-primas. O disco, que faz uma incursão por ritmos diversos, deve ter causado surpresa ao público acostumado com Gil tocando bossa nova, baião, samba e xote: ele faz uma incursão nos ritmos que estavam em voga na época, reggae e rock, e em momento algum decepciona o ouvinte.

“Extra II (O Rock do Segurança)” abre o disco com tudo: o baixo providencia um riff rápido e dançante e, no refrão, o sintetizador faz a harmonia no contratempo. Vibrante! “Feliz por um Triz” também é legal, mas a mais divertida é, de longe, “Pessoa Nefasta”, que tem uma das melhores letras de todos os tempos. Gil roga pragas como ninguém! (“Tu, pessoa nefasta/ faz o espírito obeso/ correr, perder peso,/ ficar são!”)

Em seguida vem “Tempo Rei”, que é uma das minhas favoritas do Gilberto Gil, uma prece ao tempo, que lentamente corrige os males do mundo e esculpe a beleza em todos que toca. A música é mais lenta em contrastante com as três primeiras, mais enérgicas. Logo depois ouvimos “Vamos Fugir”, provavelmente uma das músicas de maior sucesso de Gilberto e que conta com participação de ninguém menos do que os Wailers (a banda da qual Bob Marley fez parte e, mais tarde, virou a banda DELE). Bob Marley, curiosamente, não aparece na gravação.

Há ainda, “Índigo Blue”, “Vem Morena”, "A Mão da Limpeza" e “A Raça Humana”. “Vem Morena” é originalmente um baião de Luiz Gonzaga, que Gil adaptou a instrumentos elétricos. A música inteira é ditada pelo baixo de Liminha, que toca o tempo todo usando uma técnica chamada “slap”, que consiste em bater nas cordas e dá um efeito vibrante difícil de explicar. E, por fim, “A Raça Humana” é também um reggae, lindo de arrepiar, especialmente quando Gil começa a cantar, sem palavras, com seu falsete característico. A letra descreve maravilhosamente o eterno sofrimento da Humanidade (“A raça humana/ risca, rabisca, pinta/ à tinta, a lápis, carvão ou giz/ o rosto da saudade/ que traz do gênesis”). “Índigo Blue” é um reggae estilizado, também muito bonito, mas o conteúdo da letra me impede de falar mais num texto que será publicado. "Mão da Limpeza", que eu acho a menos interessante do álbum, tem, no entanto, a letra mais forte, trata do racismo e da condição atual do negro no Brasil.

Um disco brilhante. Espero que eu tenha convencido vocês a comprá-lo e ouvi-lo.

20 de mai. de 2011

Agenda Cultural: "A Guerra do Fim do Mundo"

“A Guerra do Fim do Mundo”, do escritor peruano Mario Vargas Llosa*, lembra, se me permitem a comparação, uma catedral. Já lhes explico por quê. O livro é uma versão romanceada de um episódio histórico ocorrido no Brasil, a Guerra de Canudos, e se inspira em “Os Sertões” de Euclides da Cunha – a quem, aliás, Mario dedica o romance.

A obra reúne várias histórias de personagens, fictícias ou verídicas, de alguma forma ligadas a Canudos: os aflitos pela miséria e pelo abandono da caatinga que peregrinaram pelo sertão atrás de Antonio Conselheiro e fundaram o povoado de Belo Monte, os soldados e oficiais das quatro expedições militares enviadas para suprimir a revolta, um europeu que acredita que Canudos é uma experiência anarquista (!) , um jornalista (inspirado, creio eu, em Euclides da Cunha), um rastejador e sua esposa. A história começa introduzindo, um por um, os seguidores de Antônio Conselheiro, suas trajetórias miseráveis em um mundo abandonado e atrasado até encontrar a salvação em um carismático e admirável líder religioso.

A história por si só já é ótima, relatada sob os pontos de vista das diversas personagens da trama, ilustrando a série de mal entendidos que levou à resistência heróica de Canudos, ao preconceito de que se tratava de uma revolta monarquista qualquer e, por fim, à tragédia. E o sr. Vargas Llosa sabe interromper com precisão uma história para manter o suspense e a curiosidade do leitor. Mas sou obrigado a dizer que os pontos altos são os momentos em que o narrador descreve o carinho com que Antônio Conselheiro prega a seus seguidores. E, nesse sentido, o livro lembra uma catedral: não apenas pela riqueza de detalhes, mas principalmente por provocar admiração pelo poder da fé. Uma catedral é construída de modo a que os seguidores sintam vontade de rezar e os não-religiosos, se não for possível convertê-los, pelo menos reconheçam o poder da religião.

*Mario Vargas Llosa é considerado um dos maiores escritores latino-americanos, ao lado de Júlio Cortázar, Carlos Fuentes e Gabriel García Márquez, ganhou um prêmio Nobel de Literatura em 2010 e lançou, também em 2010, sua mais recente novela - “O Sonho do Celta”.

13 de mai. de 2011

Agenda Cultural: Festival MPB Total 2011


Ocorrerá, no dia 22 de maio (domingo), no Parque Anhembi (Av. Olavo Fontoura, 1209 – Santana), o Festival MPB Total 2011. O Festival contará com a presença de consagrados e populares intérpretes/compositores da música popular brasileira, como DJ Iraí Campos (começando às 13h30), Arnaldo Antunes (às 14h45), Vanessa da Mata (16h30), Lenine (18h15) e Seu Jorge (das 20h30 até 21h15). Os portões se abrem às 13h. A idade mínima para entrar é de 16 anos.


Mais informações em: http://www.ingressorapido.com.br/Evento.aspx?ID=15260&utm_source=Banner_Destaque05&utm_medium=Banner_Destaque05&utm_content=Festival_MPB_Total_2011&utm_campaign=Banner_Destaque05&utm_nooverride=1

11 de mai. de 2011

Agenda Cultural: Olhares Impressos

Hoje teremos um Agenda extra porque o evento em questão é muito legal e, mais importante, acaba esse fim de semana.

Está ocorrendo, até o dia 14 (sábado), das 10h às 20h, no Ateliê Michelangelo (r. Fradique Coutinho, 798 – Vila Madalena, tel.: (11) 3815-3800), a exposição “Olhares Impressos”. A exposição, que faz parte da primeira edição do programa SP Estampa, promovido pela Galeria Gravura, traz uma série de gravuras pequenas.

Algumas obras acabaram se destacando e são, apesar das dimensões pequenas, visualmente impressionantes. Gostaria de mencionar “Escarpa”, de Mari Dias, que parece reproduzir um recife coberto por coral, mas só com tinta e sem traços, o que dá um aspecto “submarino” que eu não imaginava possível. Sinto-me obrigado, também, a falar do “Pingüim”, de Rafael Kenji, um exemplo intrigante de como fazer perspectiva usando a técnica de xilogravura, que consiste em talhar o desenho em uma matriz de madeira, passar tinta e pôr uma folha de papel para copiar a gravura. O sr. Kenji consegue fazer os efeitos de luz e sombra com uma precisão assustadora, provavelmente por ser discípulo de Ernesto Bonato, um senhor que cria xilogravuras que mais parecem fotos.

Uma xilogravura (não uma foto!) de Ernesto Bonato, mestre de Rafael Kenji

Devo também fazer justiça a “Hécate”, da curadora Carola Trimano, que guiou minha breve visita à exposição. Hécate é (são) uma(s) das deusas gregas da Lua, representada por três rostos femininos, cada um representando uma fase lunar (a face que representaria a lua nova não aparece), e também das encruzilhadas e, portanto, das decisões. A gravura, feita em estilo medieval – semelhante a uma carta de tarô –, é, acredito, uma homenagem às decisões, um dos aspectos mais difíceis da vida e ao qual o homem (especialmente administradores e economistas) dedica a vida inteira em busca da melhor escolha. (Mas talvez eu ache isso porque estou em uma faculdade de economia e administração!)

Hécate, deusa das encruzilhadas - e da escolha
A sra. Trimano oferecerá, no dia 14, às 14h, também no Ateliê Michelangelo, um workshop de gravuras ecologicamente sustentáveis e pode estar disponível para uma visita guiada pela exposição (pergunte no balcão). Para maiores detalhes sobre o curso, veja http://passarodepapel.blogspot.com/

Agradecimentos especiais a Mari Dias e ao Sean, que nos recomendaram a exposição.

6 de mai. de 2011

Agenda Cultural: "Songs For Days" - Joff Winks Band


“Songs For Days” é o único disco – apesar de uma coleção de EPs - do grupo britânico Joff Winks Band. A banda é um dos projetos do quarteto composto pelo próprio Joff Winks (guitarra e voz), Matt Baber (teclados), Brad Waissman (baixo) e Paul Mallyon (bateria), que correntemente atua sob o nome de Sanguine Hum. O disco foi lançado em 2007 por um selo independente chamado Troopers For Sound.

Quando ouvi, sob recomendação de um amigo, uma amostra do disco, eu o comprei imediatamente! Eu fiquei sinceramente surpreso com a qualidade dos músicos, a ênfase dada ao baixo e aos teclados, e a complexidade da música, que, no entanto, não é difícil nem desagradável de se ouvir. Os grupos de rock de hoje em dia costumam compor músicas com estruturas simples e, infelizmente, previsíveis: quase sempre começam a canção com um certo volume, tocam mais forte durante o refrão (a parte que tem que grudar na sua cabeça) e repetem, formato A-B-A-B, com progressões de acordes bem óbvias. A banda faz questão de cuidar bem das dinâmica e cadência de cada música, mas sempre transmitindo emoção e uma vontade de cantar junto (e às vezes, admito com certa vergonha, de dançar). "Milo", "Juniper", "Before We Bow Down" e "Little Machines" são particularmente bonitas, sempre com riffs imaginativos e interpretações intensas de Joff Winks nos vocais. Em Juniper, em particular, há um trecho em que ele grava duas melodias diferentes ao mesmo tempo, fazendo um pequeno contraponto. O efeito - confesso também com vergonha - me dá arrepios.

Se minha modesta resenha tiver convencido você a ouvir “Songs For Days”, eu também sugiro que entre no link da Troopers For Sound - http://troopersforsound.com/catalogue/songs-for-days/ -, que dispõe amostras gratuitas de cada canção, vende o disco ou as canções individualmente.