“A Guerra do Fim do Mundo”, do escritor peruano Mario Vargas Llosa*, lembra, se me permitem a comparação, uma catedral. Já lhes explico por quê. O livro é uma versão romanceada de um episódio histórico ocorrido no Brasil, a Guerra de Canudos, e se inspira em “Os Sertões” de Euclides da Cunha – a quem, aliás, Mario dedica o romance.
A obra reúne várias histórias de personagens, fictícias ou verídicas, de alguma forma ligadas a Canudos: os aflitos pela miséria e pelo abandono da caatinga que peregrinaram pelo sertão atrás de Antonio Conselheiro e fundaram o povoado de Belo Monte, os soldados e oficiais das quatro expedições militares enviadas para suprimir a revolta, um europeu que acredita que Canudos é uma experiência anarquista (!) , um jornalista (inspirado, creio eu, em Euclides da Cunha), um rastejador e sua esposa. A história começa introduzindo, um por um, os seguidores de Antônio Conselheiro, suas trajetórias miseráveis em um mundo abandonado e atrasado até encontrar a salvação em um carismático e admirável líder religioso.
A história por si só já é ótima, relatada sob os pontos de vista das diversas personagens da trama, ilustrando a série de mal entendidos que levou à resistência heróica de Canudos, ao preconceito de que se tratava de uma revolta monarquista qualquer e, por fim, à tragédia. E o sr. Vargas Llosa sabe interromper com precisão uma história para manter o suspense e a curiosidade do leitor. Mas sou obrigado a dizer que os pontos altos são os momentos em que o narrador descreve o carinho com que Antônio Conselheiro prega a seus seguidores. E, nesse sentido, o livro lembra uma catedral: não apenas pela riqueza de detalhes, mas principalmente por provocar admiração pelo poder da fé. Uma catedral é construída de modo a que os seguidores sintam vontade de rezar e os não-religiosos, se não for possível convertê-los, pelo menos reconheçam o poder da religião.
*Mario Vargas Llosa é considerado um dos maiores escritores latino-americanos, ao lado de Júlio Cortázar, Carlos Fuentes e Gabriel García Márquez, ganhou um prêmio Nobel de Literatura em 2010 e lançou, também em 2010, sua mais recente novela - “O Sonho do Celta”.
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